terça-feira, 22 de setembro de 2015

Foi com a caneta em punho que comecei esse texto. É uma metalinguagem, já dizendo. Um conto que fala sobre uma carta de amor. E também sobre como meus sentimentos repousaram tão graciosamente nas margens do papel, permanecendo ali negligenciados. É sobre a dor de passar despercebido. Enfim, foi com a caneta em punho que comecei esse texto. No emaranhado do meu tédio diário, abri uma folha branca do meu caderno de rascunhos e meu punho começou a deslizar pela folha. Mas o que surgiria daquele espaço branco, seria dessa vez especial. Eu poria ali a tradução do meu amor, e aquela coroa de versos eu daria de presente para comemorar nossos meses, que já totalizavam 5. Deixei com as que as palavras caíssem livremente na folha, sem aprisionar nem aprimorar e sem que apagasse qualquer erro. Eu quis que o texto fosse carregado de amor natural, queria que a curva dos versos fossem simples e singelos, assim como o rosto de dois amantes que acordam pela manhã. A cada letra, eu despia um arsenal da minha armadura. Conforme o texto ganhava sabor, eu me sentia mais vulneral por exportar o que antes só havia nas curvas mais íngremes do meu coração. Nas duas folhas por fim, eu coloquei o que jamais falaria com minha voz. Meus medos, meus amores, minhas felicidades, minhas desculpas, meus gostos, minhas ousadias, minhas perspectivas e meus planos. A linha do tempo dos meus sonhos com tanta doçura seria entregue a alguém. E ao fim de tudo, eu estava nu. A prazeirosa fraqueza de amar tinha sido manchete daquele texto. Me destruir agora parecia tão fácil. Mas eu pouco me importei, porque imaginei que seria recompensado, ao menos com um sorriso de obrigado. Entreguei a carta sem muita cerimônia, e então ela foi posta em cima da escrivaninha para ser deleitada num momento mais apropriado. 2 dias depois a carta ainda repousava na mesma posição que foi deixada. As palavras que foram feitas para serem lidas, ficaram sem função jogadas no papel. Ver o texto ali junto a outras papeletas sem valor, foi como olhar de longe para o meu amor e ver que ele já não vale mais tanto a pena. Aos olhos de quem o tem, o sentimento pareceu ser diminuto demais pra ser notado, condenado ao esquecimento. Pareceu não ter valor. Chegou a ser teatral olhar para a carta intacta. E no mesmo instante, meu coração apertou por saber que minhas sentimentalidades não são nem ao menos interessantes. Então mais que depressa eu peguei de volta para mim aquelas palavras, enxuguei a doçura do papel, e recolhi para dentro da minha bagagem o envelope que guardava meus devaneios. Então, mais uma vez eu me encho de arrependimento por tentar colocar para fora coisas do coração. Desde sempre eu me acostumei a não expor meus pensamentos e guardar meus amores no porão. O mundo nunca esteve preparado e disposto para mim. E mais uma vez não está. Mas o erro foi meu, de insistir no equívoco de declarar minha paixão. Minha lamúria vai continuar sendo só minha, meu amor vai continuar sendo meu segredo. Mas, meu bem, você há de aprender um dia: eu gosto de me omitir não por falta de amor, mas por excesso dele.